terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Olhos

Quero apenas cinco coisas..

Primeiro é o amor sem fim

A segunda é ver o outono

A terceira é o grave inverno

Em quarto lugar o verão

A quinta coisa são teus olhos

Não quero dormir sem teus olhos.

Não quero ser... sem que me olhes.

Abro mão da primavera para que continues me olhando.

(Pablo Neruda)

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

1/11

No primeiro dia de dezembro o fascínio dos dias primeiros não brilhou. Talvez por ser o último mês do ano a sensação de começo se apaga. É diferente de um 1/11, seqüência de primeiros, uma sinergia de números que traz a esperança do novo começo. Falsa esperança. Falsa não, palavra muito forte (na vida é necessário eufemismos para aliviar o peso de viver), dissimulada esperança. Oblíqua também não, pois o olhar revelou demais, mais que devia, mais que queria. Essa coisa de revelar deveria ser proibida e o segredo coroado como rei supremo, idolatrado, protegido, guardado, como uma dádiva, na palma da mão. Dádiva que virou ferida, beijo que virou mordida, coração que virou nada. E o punho se abre contrariado, mas o segredo permanece, não quer voar, cicatrizou e agora faz parte das linhas da vida, tão óbvia que até a mais fajuta das ciganas pode ler: “tem alguém na sua vida”, e arriscaria “uma loira”. A necessidade de credibilidade força a invenção de detalhes - caiu por terra o artifício da vigarista. Tão claro, tão fácil de ver, todos sabiam, todos desconfiam. O ator excêntrico não podia manter sua máscara pesada e elaborada demais por muito tempo. A leitura de mãos nada mais é que jogar um belo verde. Julgava-se tão bom nesse jogo que descobriu o que não queria, perdeu a aliada ignorância. Mas essa amiguinha um dia abandona a todos e vem a verdade egocêntrica em seu lugar. Arrogante estapeia a cara, toma tudo como seu, não vai embora, declara usucapião, não divide o aluguel e nem ajuda na louça. “Ah infeliz!” diriam os gregos, afinal, a verdade era o plot principal de suas tragédias.
“Far-te-ei agora algumas perguntas.”
“Pergunta, não serei por isso criminoso”... mas será Édipo, assim que conhecer a verdade. Conhece-te a ti mesmo. É fácil falar. Sócrates esqueceu que há verdades que não podem ser ditas, perguntas que são melhores sem respostas. Por que o pedido de um vale mais que o de outro? Por causa da palavrinha impronunciável que encerra em si o sentido do universo.
E por todas as impronunciabilidades que se escondem com o rosto afundado nas mãos.
Da janela do último andar dizem que se pode ver o universo refletido nos vidros espelhados, enquanto um canto caetano canta seus encantos. Não adianta descer as escadas, correr, se apressar para ver sua origem, a imagem real tem menos significado que seu reflexo. É um simulacro de si. “Dissimulada”, perdida, incompreendida. E permanecerá assim enquanto houver um coração e no coração razões que a própria razão desconhece.

Desde primeiro de novembro uma eternidade passou. Mas a eternidade não passa.
Novembro acabou. Mas novembro não acaba.
Não foi doce, foi amargo esse novembro e vai durar enquanto o novembro existir.
Esquecer é impossível, bem sabes. Esquecer nada mais é que lembrar de que não é permitido lembrar.
Esquecer é desejar escondido o impronunciável.
Um Pietro Belli se tranca no sótão, só sairá quando o violino parar e a dor passar.
E passa,
passa a todo instante.
Não pára,
para sempre passará.








Ai esse novembro que não passa!